Sou um poeta em via de extinção,
daqueles que acreditavam no sonho,
sobretudo na poesia.
Daqueles que utilizavam as palavras para escrever
e nesse exercício solitário deixavam que a vida
escorresse no poema.
Sou um poeta em extinção,
ridículo como uma carta de amor,
tipo que se emotiva à toa
a qualquer pretexto para sentir-se só.
Daqueles que de alguma maneira
passeavam com animais imaginários
e guardavam uma ovelha no quarto.
Daqueles que às manhãs acreditavam num novo dia
e aguardavam a tarde chegar conversando com as formigas.
Daqueles poetas que não existem mais
porque a poesia mudou
e se antes vivia nas sombras
era sua descoberta que importava.
A poesia pertencia à vida do homem,
dos bichos, das plantas e das pedras,
mas hoje isso é sonhar demais.
Tanto sonho não cabe mais na cabeça de um poeta,
só nos que estão em via de extinção,
daqueles que iam à igreja para esconder-se do mundo
sem saber que a igreja é o esconderijo de Deus.
Nas madrugadas era possível falar-se sozinho,
mas hoje a boca se fecha inerte
ao passar das horas paradas nos relógios.
Sou daqueles poetas que já morreram
pedindo pela liberdade
quase sempre ferida a golpes perversos
da força e da crueldade.
De tal forma
que não há mais lugar para poetas assim,
senão o resto da sina
não de seguir,
mas de parar nas esquinas
sem perceber os sobressaltos.
Álvaro Alves de Faria
De “Babel”, 2007
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