sábado, 15 de agosto de 2020

Padaria

 Por simples compostura, da última vez em que nos vimos, não disse de minha vontade assoladora de lamber os teus dedos.  A metafísica que rege essa e tantas outras sociedades ignora os anseios de padaria. E eu talvez fosse por demais acabrunhado para esparramar na mesa todas as minhas cartas. As de amor, talvez, mas com que cara você me olharia depois de contemplar, quiçá estarrecida, essa minha máscara que escapa da sombra um tantinho? Um alçapão se esconde por trás de cada palavra já escrita na história da humanidade. As minhas carregam facetas, de janelas reais e virtuais. Em meu teclado já dançaram tantos desejos que a própria cor rubra talvez ficasse vermelha ao caminhar por esse caminho de teclas e pensamentos. Não, jamais escrevi um poema de Drummond, mas fiz da palavra o que ela me permitiu que fizesse, como um infante que se confessa e descobre mais adiante, boquiaberto, que a palavra é também afrodisíaco, como quem descobre que a sombra também é Dionísio, como quem imagina funções para a orelha que extrapolam o dicionário. Sim, minha grande vontade era extrapolar o dicionário com teus dedos.

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